domingo, 17 de agosto de 2014

AIOLI NÃO É PARA MENINOS

Nos anos 80, o meu pai - pessoa que nunca cozinhou, não tinha um interesse especial pela comida e comia tremoços com o mesmo entusiasmo que eu mostro perante um bombom - fez a colecção completa do Curso Internacional de Cozinha Prático e Ilustrado do chefe Pol Martin. Os fascículos do Curso foram religiosamente comprados todas as semanas até os quatro volumes estarem completos. Na altura, embora eu já gostasse de cozinhar, o meu entusiasmo pelos fascículos ficou reduzido às receitas de crepes. Digamos que ali pelos 15-16 anos eu tinha uma verdadeira obsessão por crepes. Crepes, crepes, crepes. Eu vivia para fazer e comer crepes. Normalmente com recheios doces; mas também era comum embrulhá-los com queijo no interior. Recordo-me de um dia ter trazido uma das minhas grandes amigas de então para passar uma tarde cá em casa e de ter estado horas a fazer crepes. Em vez de estudarmos. Eu fazia, ela comia. Uma alarvidade. Não sei como a rapariga não explodiu.
A verdade é que tinha outras preferências em termos de literatura gastronómica. Entre a Cozinha Tradicional Portuguesa, da Maria de Lourdes Modesto, e Doze Meses de Cozinha, uma edição das Selecções do Reader's Digest, eu realizava-me enquanto cozinheira amadora. Gostava particularmente da secção de pastelaria deste último livro. Um conjunto de páginas sem ilustrações a cores, mas com receitas muito bem explicadas e cujo resultado estava sempre garantido. O Curso do chefe Pol Martin, cujos conteúdos eram obviamente os da clássica cozinha francesa, pouco se enquadravam nas minhas referências culturais ancoradas nas cozinhas das avós Susana e Jesuína. Para além disso, muitos ingredientes que o chefe Pol referia não existiam na Figueira da Foz na década de 80. Havia lá arroz selvagem? E eu fazia lá ideia do que fossem pétoncles?!
Depois do meu pai morrer, fiquei com esta colecção. Arrumei-a na categoria dos livros generalistas de cozinha, e ali ficou, mais ou menos esquecida. A questão é que, quando iniciei as aulas do Curso de Cozinha Intensivo na ACPP, resgatei os quatro volumes do Chefe Pol Martim e comecei a reler as receitas com outra maturidade, outro interesse e uma outra curiosidade. 
As páginas estão profusamente ilustradas com fotografias que documentam todas as etapas das receitas. Não há ali espaço para dúvidas, nem hesitações. O layout dos fascículos nada tem a ver com aquilo que hoje se faz, quer na blogosfera, quer nas edições recentes de livros de cozinha. É um registo fotográfico técnico. Cumpre a sua função - ensinar.


Quando andei a testar algumas receitas para a avaliação final do Curso Intensivo de Cozinha, fiz o aioli, de memória, que tinha visto numa das receitas do chefe Pol Martim. Não tinha presente as quantidades de todos os ingredientes, improvisei um pouco e socorri-me, também, da receita de um aioli feito por um dos chefes convidados do Curso. Hoje preparei o aioli a preceito. Com cinco dentes de alho. Não é coisa para meninos. Nem meninas. Tradicionalmente, o aioli é feito esmagando-se e misturando-se num almofariz os ingredientes. Pode, contudo, usar-se um robot de cozinha para facilitar o trabalho. Até porque no almofariz os dentes de alho têm tendência a voar quando são esmagados...


Ingredientes
5 dentes de alho (os menos corajosos podem usar uma quantidade inferior)
2 batatas cozidas
2 gemas de ovo
3/4 chávena de azeite
sumo de limão
sal e pimenta qb

Preparação
Começa por se esmagar os dentes de alho no almofariz. De seguida, juntam-se as batatas cozidas, ainda quentes, e misturam-se muito bem com os alhos. Adicionam-se as gemas e volta a misturar-se o preparado. O passo seguinte consiste em deitar o azeite, gota a gota, mexendo sempre. Por fim, tempera-se de sal e pimenta e com um pouco de sumo de limão. É óptimo servido com palitos de cenoura e aipo.

4 comentários:

  1. Aioli me leva a Nimes, a frutos do mar com aioli perto da arena romana. Foi onde provei pela primeira vez, é o sabor daquela região para mim :) Eu não tenho braço para isso, a consistência está com um aspecto muito bom! A minha mãe tinha coleções de receitas, mas sempre fazia as mesmas. Quero ver se trago as da Revista Claudia para cá, ela até encardenou. Eu também já tive uma fase de fissura por crepes, minha mãe fazia aos domingos para o "jantar". Eu comia puros mesmo, ou com geleia. Se fosses minha amiga naquela época, serias "minha ídolo"! :)))))
    Por falar em comida (para variar...), as coisas aqui estão muito fora de controle, conseguiste entrar numa dieta por aí? Beijinhos!

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    1. Olá!
      Aioli é daquelas coisas que eu era capaz de comer todos os dias...mas, pronto, eu também adoro alho! Há dias testei um puré de batata e raiz de aipo. Uma delícia. Melhor que o puré de batata e beterraba.
      Sim, tenho evitado as coisas que me deixam literalmente de cama - glúten e açúcar...com excepção do dia de ontem, que foi dia de chá das 5 com familiares de mate e que basicamente se traduziu numa indescritível orgia de comida :)))
      Beijinhos

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  2. E com esta, que se dane a maionese. Já me converti antes de experimentar, pois parece delicioso. Dos livros que mencionou, tenho o "12 meses", e é fantástico, sem dúvida! (Até agora,só a torta Dobos deu para o torto, mas só descanso quando testar todas. )

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    1. Atenção à navegação: comer aioli afasta vampiros :))))))
      Ao contrário do "12 meses" - que é certinho nas receitas - há livros que me levam ao desespero. Lá em casa da minha mãe habita um que é de uma pessoa cortar os pulsos. Cada receita, cada asneira. A obra é um elogio do erro. E, nos crentes anos da adolescência, produziu muita coisa directamente para o caixote do lixo :)

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Sou uma antropóloga que só pensa em comida...
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